segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

É Dia de Feira!!!!!!!



A feira é uma tradição cultural e na história da humanidade está repleta de referências a feiras. Não se sabe ao certo onde e quando apareceu a primeira feira, no entanto há dados que nos permitem afirmar que em 500 a.C. já havia feiras no Médio Oriente. As primeiras referências a feiras aparecem misturas com referências ao comércio, às festividades religiosas e aos dias santos. As feiras sempre revelaram um carácter comercial desde o início. Mercadores de terras distantes juntavam-se, trazendo os seus produtos autóctones para troca por outros. É também evidente que a religião andou de mãos dadas com o comércio. A palavra latina feria, que significa dia santo, feriado, é a palavra que deu origem à portuguesa feira, à espanhola feria ou à inglesa fair. As feiras são uma das mais importantes instituições do período medieval em Portugal. Quase todas as feiras se realizavam em épocas relacionadas com festas de Igreja e, no local onde se faziam, existia uma paz especial, a paz da feira, que proibia todos os actos de hostilidade, sob penas severas em caso de transgressão. Durante a realização das feiras medievais interrompiam-se guerras, a paz era garantida para que os vendedores, dispostos lado-a-lado, pudessem trabalhar com segurança. Da mesma maneira, guardas vigiavam todo o perímetro de modo a evitar que algum desordeiro pudesse causar incómodos aqueles que por ali passavam e desejavam efectuar suas compras. Os mercadores medievais realizavam as transições comerciais e intermediavam trocas numa actividade eminentemente itinerante. A origem das feiras livres no Brasil confunde-se com a sua própria história. Desde o período do Brasil Colônia, elas multiplicaram-se, assumindo importante papel, não apenas no abastecimento, mas como fundamental elemento que estrutura a própria organização social e econômica da população. Com a paz estalada e as feiras lotadas de vendedores e compradores, estavam lá, em meio a essas multidão de pessoas dezenas de saltimbancos, pregoeiros, trovadores e artistas fazendo seus malabarismos, cantos e procuravam divertir o povo que se movia de barraca em barraca, prosseguindo nas compras. Performances e açoes desenvolvidos dentro das feiras populares sempre aconteceu e sempre acontecerá, pois a essas performances estão ligados ao genuino e espotaneo das feiras. Nas feiras a concorrência é grande, pois existem várias barracas que vendem os mesmos produtos. Para atrair os clientes, os feirantes gritam, demonstrando a qualidade de seus produtos aos clientes ou através de frases engraçadas, brincando com a freguesia, tornando o ambiente bem descontraído e animado. Dentre as frases temos: “moça bonita não paga, mas também não leva”, “Gostoso não é? Pode experimentar outra vez”, “aqui é barato, o marido da barata”, “pega no melão que aqui ele tá bom”. Esses bordões e frases já são parte de uma cultura oral milenar, pois a séculos eles são repetidos e renovados ininterruptamente. Mesmo hoje, em plena sociedade da informação, dos mercados virtuais e da economia globalizada, as feiras persistem como um traço sócio-cultural que identifica regiões e a uma realidade muito distante e permanente na comunicação da humanidade.



Banana Prata Só Paga R$ 2....

Esse é o primeiro vídeo da 1ª etapa da nossa pesquisa. Optamos em começar nas feiras livres da cidade do Rio de Janeiro, pois nas feiras está a origem de nossa pesquisa. Nas feiras medievais está a origem da "Cameloturgia", da teatralidade através da oralidade. Mesmo que as feiras atuais tenham perdido uma boa parte de seus atraentes verso, rimas e brados, substituídos por anúncios dos preços sem nenhum carisma ou diferencial.





Quando estavamos caminhando pela feira do Bairro de Fátima, no Centro do Rio de Janeiro, um cântico chegou aos nossos ouvido e aguçou a nossa curiosidade. Não era só mais um anuncio de preço, mas sim um canto com graça, ritmo e bem simpático que se destacava no meio do burburinho da feira. Banana Prata só paga dois reais..... Não era o preço, pois é o mesmo em todas as bancas, mas era o canto e o carisma do vendedor que atraia muitos clientes. Ele vende muito mais que seus concorrentes. Fica a duvida: Será que o consumidor/publico prefere um vendedor/ator mais convidativo e espontâneo ou introspectivo e sisudo?




Procurando algo na oralidade e sonoridade que desperta-se a noss atenção. Andamos por boa parte da feira, até que um canto chamou a atenção. De longe se ouvia: Banana Prata só paga R$ 2,00... Não era só mais uma divulgação de valor ou mercadoria, não. Era uma musicalidade diferenciada do burburinho da feira. Um canto alegre ritmado e simpático. Percebemos que a barraca estava cheia e o feirante (Luis Carlos), estava atendendo a todos os clientes com a mesma simpática, ritmo e agilidade da musica. Ele só para de cantar para saber quantas dúzias o cliente vai levar. Logo em seguida volta a cantar e improvisar suas rimas, versos e seus bordões com seu inglês todo particular. Ele vende muito e não para de cantar, brincar, rimar e atender em nenhum momento. Reparei que os outros vendedores de banana não são muito comunicativos e em sua maioria são sisudos. E em contra ponto, pelo mesmo preço, Luis Carlos está sempre de bom humor, sorridente e com uma energia inquietante que irradia e contagia seus clientes. Não podemos deixar de perceber que a tradição dos brados, cantorias e rimas estão se perdendo. A função espetacular da feira está perdendo espaço para a comercialização dos produtos, sem a relação com os moradores do bairro, sem a menor atração ou sedução cênica ou afetiva. A venda e o anuncio agora é só do preço e do produto. As feiras estão perdendo espaço para as lojas de hortifruti e por isso os feirantes estão se afastando de suas tradições. Ainda é o espaço para a venda de hortifrutigranjeiro, porém somente a venda sem nenhuma relação com o passado ou com o espetacular. E quando eu que pesquiso ou vou comprar na feira, não estou me importando com o preço, pois quase todas as barracas trabalham o mesmo preço de venda. O que gera a tração é o que chega aos ouvidos do comprador/pesquisador e o eleva até a barraca para comprar e sair com a sensação de que vez a melhor escolha. Fica a duvida Tostines: Será que ele vende mais porque canta ou o canto dele que faz ele vender mais? Olha a banana prata, só paga R$2,00.......

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Caminhada pelos Trilhos

No último domingo, dia 13/02, fizemos uma caminhada pelos trilhos da Estrada de Ferro Madeira Mamoré (Porto Velho-RO).

Saímos da Praça às 9:30 da manhã e a primeira parada foi logo ali perto: no Galpão da estação, onde estão depositados muitos vagões, máquinas e peças de ferro que um dia já foram úteis à EFMM. Foi interessante reparar na cenografia existente naquele lugar, visto com outros olhos. Seguimos em frente e nos deparamos com uma parte dos trilhos que flutuava no ar: um pedaço da rua tinha desabado e só sobraram os trilhos, ligando um lado ao outro. Para atravessar, tivemos que usar os pequenos barcos que cobravam R$2,00 pela travessia, e é assim que os moradores do local conseguem se locomover do centro da cidade até suas casas.

O caminho era longo, e sempre pelos trilhos, fomos observando tudo à nossa volta e guardando nossas impressões pessoais. Passamos por muitas casinhas de madeira e conversamos com alguns de seus moradores. Vimos também alguns vagões da EFMM abandonados no meio do caminho (e do mato).

Uma figura importante que conhecemos foi o Sr. Carol Oeto Demiy, que foi Maquinista da Madeira-Mamoré e mora até hoje numa casinha verde à beira dos trilhos. Combinamos de fazermos uma visita e conversar com ele com mais calma. Com certeza tem muita história pra contar e vai enriquecer a pesquisa!

Mais um pouco de caminhada e chegamos ao Cemitério da Candelária, onde estão sepultados uma parte dos trabalhadores da ferrovia.

Foi uma caminhada de pouco mais de 3 horas. Nos próximos posts vamos colocando mais fotos, vídeos e as impressões de cada um sobre este dia!



Praça da Estrada de Ferro Madeira Mamoré


Galpão


Trilhos sobre o rio


Sr. Demiy, ex-maquinista da Madeira-Mamoré


Cemitério da Candelária


Veja mais fotos:

Caminhada pelos trilhos

Cameloturgia - Vendedor de remédios

Um vendedor ambulante na cidade de Buíque-PE, utilizando-se da linguagem popular para vender seus produtos.



É uma forma tradicional de se comunicar e convencer as pessoas que passam pela rua a comprarem seus produtos. 

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

A pesquisa nas ondas do Rádio



Nas margens do Rio Madeira, pela água, pelas ondas do Rádio, a notícia se espalha pela Amazônia. Aproveitamos a carona no Projeto Banzeirando para divulgar a nossa pesquisa cênica, pelo caminho percorrido pelos trabalhadores da Estrada de Ferro Madeira Mamoré.


Ao brincar de teatro, aproveitamos para fazer uma reflexão do nosso passado, viver o presente e sonhar com o futuro.

Na mata Amazônica em busca da história


"No meio da Mata, tem a lei da mata..."

Percorremos vários km em busca de fragmentos da presença dos trabalhadores da Estrada de Ferro Madeira Mamoré. Cada passo era observado pelos protetores da floresta (mapinguari, jurapari e tantos encantados) e ainda quem maos nos preocupava: os bichos (onça, cobras e tantos outros ferozes).

"Parece que a mata tem olhos... gente, estamos sendo observados o tempo todo! Ah! Meu Deus o que será de nós?"

Gente, estamos vivos. Nada aconteceu!

O Maquinista da Madeira Mamoré

A oralidade na margem dos trilhos

Uma Conversa com Sr Carol Oeto Demiy - O Maquinista do Trem da Madeira Mamoré

Rua Madeira Mamoré, 1171, KM 1, lado direito, Estrada de Ferro Madeira Mamoré.

Dia 17 de Fevereiro de 2011 - As 17 horas

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Vídeos

Durante a viagem pelos rios amazônicos que nós do O Imaginário realizamos em 2010, na 1ª Etapa do Projeto, tivemos a oportunidade de registrar vários aspectos da realidade de vida dos moradores ribeirinhos das localidades entre Rondônia e Amazonas. Alguns ainda conservam hábitos bastante parecidos com os comuns à época da construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, prova de que essa herança é rica e bastante presente nos dias atuais, principalmente às margens dos rios.

Temos muitos vídeos e fotos desse processo de pesquisa e vivência, e vamos postando aos poucos!! 



quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Encontro nos trilhos (O Imaginário)

Nós do O Imaginário nos encontramos dia 06/02/11 na Praça da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, em Porto Velho/RO, para conversar sobre o calendário de atividades do projeto e contemplar o fim de tarde à beira do Rio Madeira, com a bela vista do Rio e da Estrada de Ferro, que é um dos pontos norteadores da pesquisa "A Oralidade e A Cameloturgia - do Porto ao Rio".


sábado, 5 de fevereiro de 2011

Planejamento das atividades

A Oralidade e a Cameloturgia

O Projeto está sendo desenvolvido em várias etapas:

Novembro de 2010 – Pelas águas: uma viagem no tempo e no espaço.

No período de 22/11 a 22/12, iniciamos uma viagem sensorial, em busca de emoções e sentimentos vividos pelos trabalhadores que vieram para Porto Velho no início do século passado para a construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré. 
Nesta fase os objetivos foram:

1 - Identificar registros e fatos históricos da passagem dos trabalhadores;
2 -  Verificar as influências e as alterações na religiosidade/mitologia nas localidades;
3 - Vivenciar experiências sensoriais / emocionais, relacionadas ao tempo ribeirinho, convivência, costumes e as condições do transporte fluvial e outras.

Janeiro a Abril de 2011 – Nos trilhos da história:

Pesquisa de campo e bibliográfica, nos trilhos, na estação da Estrada de Ferro Madeira Mamoré e nos museus do Rio de Janeiro.

Abril e Maio de 2011 – Encontros presenciais – Residências artísticas

Em Abril (15 a 24), O Imaginário voltará seu foco para a cameloturgia na sede da Cia Será o Benidito, no Rio de Janeiro.
Em Maio, (15 a 24), a Cia Será o Benidito volta seu foco para a oralidade na sede do O Imaginário, em Porto Velho – RO.

Junho a Agosto de 2011 – Em busca de ações cênicas

Continuação da pesquisa de campo, bibliográfica e laboratórios. Estudo minucioso de todo a material levantado e colhido.

Agosto e Setembro de 2011 – Demonstração do trabalho no Itaú Cultural

Demonstração dos processos de trabalho na sede do Itaú Cultural e compartilhamento das experiências com os demais grupos de teatro do Brasil.

Pelas águas – uma viagem no tempo e no espaço.



Pesquisa Cênica: "A Oralidade e a Cameloturgia - Uma pesquisa cênica do Porto ao Rio", projeto conjunto dos grupos O Imaginário - RO e a Cia. Será O Benidito?! - RJ.

A pesquisa cênica envolve prática de criação, de formação e de pesquisa histórica baseada na oralidade e de sistematização de processos dramatúrgicos da oralidade e da cameloturgia, selecionado pelo Programa Rumos Itaú Cultural Teatro, que em sua primeira edição tem como finalidade promover um intercâmbio entre teatros de grupo de todas as regiões do Brasil, contribuindo para a articulação desses coletivos e para o desenvolvimento de pesquisa na área teatral.

Uma viagem no tempo e no espaço.

A grande largada do nosso processo de pesquisa aconteceu no ano passado, no período de 22 de novembro a 22 de dezembro de 2010. Fizemos uma viagem pelos rios da Amazônia, descendo de Porto Velho a Manaus, refazendo o caminho percorrido pelos trabalhadores da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, no início do século passado. Nesta etapa da pesquisa os aspectos ligados à vivência e à experimentação, que chamamos de campo sensorial (atuadores pesquisadores vivenciam as emoções e sensações), balizou todo o trabalho. Cada atuador pesquisador registrou num diário de bordo as sensações e as emoções sentidas durante os trinta dias da viagem e além de buscar fatos e registros históricos que ficaram da presença ou da passagem dos trabalhadores da Estrada de Ferro Madeira Mamoré ao longo do rio madeira.

Iniciamos a viagem sensorial, em busca de emoções e sentimentos vividos pelos trabalhadores que vieram para Porto Velho no início do século passado para a construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré. 
Nesta fase os objetivos foram:

1 – Identificar registros e fatos históricos da passagem dos trabalhadores;
2 – Verificar as influências e as alterações na religiosidade e nas crenças do povo ribeirinho;
3 - Vivenciar experiências sensoriais / emocionais, relacionadas ao tempo ribeirinho, convivência, costumes e as condições do transporte fluvial e outras.

Alguns relatos extraídos dos diários de bordo:

...nesta viagem pelos rios da Amazônia olho pra estas trajetórias de vida com orgulho e satisfação, levanto a cabeça e inflo o peito para deles falar, mesmo incomodado por lembranças do passado só eu sei o que sinto”.

“...Esbarramos numa praia, a boreste, o capitão começou então a medir a profundidade do calado, vamos tranquilos no tempo do rio”

“...O barco vai seguindo entrando a manhã, na proa do leme após o café matinal se junta um grupo conversando enquanto o piloto conduz a embarcação, a floresta vai passando, ficando pra trás, assunto dos homens é o mais variado, passando da navegação ao gosto de cada um, passam varias madeiras boiando, madeira que dá nome ao rio, passa então um pau em pé, o capitão mostra e diz que quando criança ouviu que – “pau em pé é quando alguém morreu afogado no rio” – o dia vai passando lento, dando o tom necessário da calma que se deve ter nestas paragens, não há pressa, só há rio, floresta”.

“...a noite escura e nosso navegador usava o farol para conduzir o barco, muitas madeiras passavam, galhadas realmente grandes, atento o piloto se mantinha segura ao leme com o farol em riste, um estrondo e o barco para, encalhamos, rapidamente o piloto desliga o motor, o barco perde a força, encalhamos, sim, não, o capitão corre ao comando, logo estamos a deriva, o capitão toma o leme e manda o piloto verificar o acontecido de voadeira, ele leva outro marujo, não encalhamos, mas uma galhada bateu  no fundo do barco entortando o pé de galinha que batia na elice, o estrago não foi grande, mas tivemos que encostar na margem onde estávamos, a pericia do capitão e de seus marinheiros nos conduziram com segurança e com a voadeira até a margem, o barco rodou no eixo algumas vezes até todos se aquietarem e ouvirem o comando do capitão, posso dizer que fiquei atento calmo, mas alerta a qualquer movimentação necessária, olhando tudo de um lado ao outro do convéns, tentava compreender a situação, mente pensava rápido comandada pelo coração que dava ao corpo todas essas informações, não consigo descrever estas emoções, mente rápida, olhos atentos, a calma alerta, hoje o rio nos mostrou por que se chama madeira”.

“...O sol não apareceu nesta manhã, logo cedo o capitão de pé já trabalhava no conserto, foi o dia clarear pra tudo começar, eu me pus de pé para acompanhar esta movimentação, verificado o estrago que o tronco havia feito, e sem condições e sem condições de efetuar o conserto no local, o jeito foi aproveitar a corrente e com o auxilio da voadeira empurrar o barco até o próximo destino, para lá procurar uma forma de consertar, ou reboque até onde se poderia efetuar o conserto, perdemos a palheta, a barra de direção, e outros pequenos estragos danificaram esta região sensível do barco que comanda a navegação e da direção”.

“...Ontem foi um dia entediante, nada a fazer senão balançar no banzeiro, ver os barcos que passavam, chegavam e partiam, alguns chegavam carregados de mercadorias que será deixada aqui, ou embarcada em outro barco para seguir para outros portos, alguns vem vazios para levar mercadorias ou gente, o sol foi quente como hoje, trazendo chuva breve no meio ao fim da tarde, sol quente de rachar desde o amanhecer, trabalhei duro mais com gratificação, sendo só o sol o castigo do dia, sol, luz do dia, queima esta pele, ilumina meu dia, ontem e hoje o sol brilhou, a chuva, só um cheiro, fechou o tempo fazendo toda a correria de tirar a roupa da corda, deu uma cheirada, e foi-se, assim como se anunciou, o corpo banzeirava ao sabor do rio, do sol, trazendo um sono lezo, suorento, daqueles que escorrem pelo corpo, descendo do pé do cabelo, abrindo caminho pelas costas, e se guardando dentro da calça, o anuncio da chuva ontem como hoje trouxe os diabinhos invisíveis, mosquitos minúsculos, de picada doida, mas kamikazes, picavam e não fugiam, morrendo com um tapa enquanto se fartavam do sangue alheio, passou a chuva eles se foram como vieram, do nada”

“...Não era o tédio, era o tempo, outro tempo, outros tempos, partimos, e outro tempo se fez presente, o tempo da cidade me sufocava, me incomodava, um vai-e-vem, como uma cidade no meio do rio pode ter um tempo tão incomodo, navegando desde cedo, quando o dia acorda, o tempo não me incomoda, nem passa, que tempo é esse do rio que de um lado se vê verde, uma casa aqui acolá, o tempo, tempo não há, o sol aparece no céu azul, se esconde nas nuvens brancas ou cinzas, vai chover? vem o sol? o barco desliza no rio deixando a água pra trás, quanto verde, claro, escuro, verde amarelado, verde branco, verde preto, no meio do verde a madeira, marrom? não, branca, um branco cinza, um branco pálido, com tons de bolor verde, as vezes laranja ou amarelado, esse tempo das cores vou vendo passar, vai batendo em mim, o céu tem tanto cinza, tanto azul, quando penso na minha retina, quanto tempo demoro pra perceber tanto tempo, não dá pra explicar mas o tempo, onde vai, onde está, pra que”.

“...Fiquei doente, dor de cabeça, dor no corpo e desarranjo intestinal com diarréia, passei o dia todo muito ruim, acho que pode ser uma infecção intestinal devido a dieta constante de peixe e da comida, pois o tempero é bem diferente do que estou acostumado, também pode ser uma virose, agravada pela chuva de ontem e da roupa que lavei, vou observar e me medicar aos poucos. ...eu não consegui sair do barco, o corpo todo doía, uma diarréia constante, dor de cabeça forte, tive o corpo arrasado o dia todo”

Além do diário de bordo, registramos em vídeo e fotografia as conversas e os encontros. São registros que demonstram a riqueza e a força da oralidade.