No inicio do século XIX, a cidade do Rio de Janeiro era um dos maiores centros urbanos da America Latina. Dentro desses centros urbanos, as casas eram uma espécie de unidade de produção e consumo, onde grande parte dos objetos pessoais e de uso domestico eram fabricados nessas residências. A produção domestica era uma parte para consumo interno e parte do excedente para ser vendido. Grande parte dos objetos pessoais e de uso doméstico era fabricado na própria residência e o excedente para ser vendido nas ruas, pelos próprios escravos das casas. Tais escravos eram chamados de "escravos de ganho".
O comando das atividades ficava a cargo da mulher, a dona da casa. Era ela quem mantinha sob controle a limpeza da casa, a preparação dos alimentos, o comando das escravas, além de dirigir a indústria caseira. Era de grande variedade as mercadorias dos tabuleiros das escravas ou dos escravos - quitutes, bebidas, tecidos e toalhas bordadas – e eram quase sempre orientadas pelas senhoras donas da casa as vendas nas ruas. Os escravos de ganho atuavam no comercio ambulante e nas vendas alegrando a cidade com seus gritos e cantos seguidos de crianças que iam pelas ruas atrás das mães. Carregando em grandes cestas trançadas, tabuleiros de madeira ou caixas sobre as cabeças, escravos de ganho de ambos os sexos vendiam de tudo, “artigos de vestuário, romances e livros, panelas e bules, utensílios de cozinha, cestas e esteiras, velas, poções de amor, estatuas de santos, ervas e flores, pássaros e outros animais e jóias” (GRAHAM, 1988,141).
As ruas ficavam apinhadas de escravos que tentavam de todas as formas possíveis vender seus produtos. Os espaços públicos no Rio de Janeiro do século XIX funcionavam como pontos de convergência - espaços dinâmicos de suporte de artes performáticas. As praças e ruas tornavam-se pontos de encontros e facilitavam distintas formas de interação social entre seus freqüentadores habituais, os escravos. Tais espaços constituíam-se, segundo Brugger, a "base da estrutura e da identidade das primeiras cidades coloniais brasileiras", evoluindo para o acontecimento de "inúmeras formas de interação social" (BRUGGER, 2000). A chegada do peixe fresco ao mercado, as negras vendendo apetitosas frutas tropicais, o transporte de objetos nas carroças ou pessoas em cadeirinhas, pequenos intervalos roubados entre uma atividade e outra dão a medida da diversidade do meio urbano, verdadeiros locais de trabalho, passeios, encontros e performances.
Como uma performance do cotidiano urbano do povo que ocupava as ruas e circulavam com a venda de seus produtos, havia um tipo de canto na cidade que era bastante peculiar. Era o pregão dos vendedores ambulantes, uma espécie de propaganda dos produtos à venda, que anunciavam as mercadorias pelas ruas. No pregão, a performance consistia de cantos e gritos de melodias, em forma rimada, acompanhado ou não de tambor ou violão, verdadeiro jingle de publicidade. Às vezes, paravam para descansar, reunindo-se em torno de um cantor principal e cantando em grupo.
O barulho e as histórias da rua, as idéias e imagens de representação coletiva com suas origens e acomodações dentro do espaço público fascinavam os viajantes que pintavam freqüentemente seus trajes originais. Como define Brook, um verdadeiro "Teatro Rústico" ou, como prefiro nomear uma verdadeira Performance Urbana do Cotidiano, nem por isso menos espetacular. Nas ruas, três elementos marcavam e delimitavam o acontecimento desta Performance Urbana do Cotidiano: A repetição ou o lado mecânico do processo, rodas de cantos e danças que se formavam constantemente; a celebração, ou melhor, a representação que pode tornar presente tradições e mitos ancestrais dando-lhes vida; a assistência, uma platéia sempre participativa. Performances próximas do povo, que se retro alimentavam dele.
O Rio, a capital do Império e principal centro urbano da América do Sul neste período, produzia nas suas ruas música, canto e dança mesclada numa mistura de sons e movimentos, forjando um estilo brasileiro harmonioso e peculiar. A escravidão, nesse caso, era realmente uma cacofonia de tradições culturais ricas e híbridas e criando assim as formas diversas e espetaculares, a cultura da cidade Mas no século XIX, os escravos tinham suas áreas de atuação definida e suas vendas baseadas na agricultura de subsistência, fabricação, manufaturados e comercio, ficando restritos aos setores de baixo status da economia na época.
Hoje, século XXI, quem são os vendedores nas praças, calçadas e ruas? Hoje quem são os escravos modernos e ambulantes, camelôs, crianças, famílias inteiras de rua que transitam por estes espaços. Como são as novas performances do cotidiano urbano do Rio, de circulação de informações, de lazer, de ordem e desordem? Como são e onde estão esses momentos de transgressões espetaculares? As performances foram se adaptando aos novos mundos sociais que por sua vez foram sendo definidos por novas convenções e estabeleceram outro caráter na ocupação destes espaços. Infelizmente, os negros ainda têm uma "subsistência" mínima garantida nas ruas, praias e camelódromos do Rio de Janeiro. Mas o espetacular das ruas e praças está caminhando na mesma linha do que a tradição e da profissionalização do espaço publico, tanto para artistas e pequenos comerciantes informais. Ainda hoje, esse espaço parece estar restringido ao baixo status da economia e da arte das cidades, aonde ainda se tem a perseguição que a polícia faz com freqüência aos ambulantes e artistas, com um suposto “Choque de Ordem”. O artista Martenze Marte, que faz estatua viva, declarou: "Em tempo de paz qualquer pessoa tem o direito de ir e vir com os seus bens e sua arte dentro do que está escrito no artigo 5, parágrafo 9 da Constituição Brasileira”. Este é um exemplo do atual povo de rua que habita os espaços urbanos. Não são mais escravo de ganho, mais são os camelôs, feirantes e artistas os legítimos co-autores da história urbana de um país chamado Brasil.
Martenze Marte Óculos Madame, na minha mão é mais barato!!!!!!! É promoção!!!! É pra mocinha!!!!!
Original!!!!!
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